Página de posts do Blog

11 de julho 2022

Dos 6 a 12 anos: O momento imperdível das regras!

Texto dedicado às famílias com filhos de 6 a 12 anos.

Por Marcia Righetti, formadora Montessori, pesquisadora, fundadora do projeto pedagógico da Aldeia Montessori e do Centro de Estudos Montessori do Rio de Janeiro.

Existe algo mais fascinante do que observar uma criança de seis a nove anos?

Nessa idade, em que hoje ela pensa que já não se é mais criança, mas ainda se encontra distante de ser efetivamente adulto; o ser humano ganha aspectos de uma singularidade ímpar. Maria Montessori chama este período de metamorfose, pelas transformações pelas quais passa a criança.

Fase da vida em que não é raro crescer mais de oito centímetros e engordar até três quilos em um só ano; meninos e meninas constituem espetáculos de originalidade indescritível.

Falam em profusão, atropelam palavras ou mergulham em silêncios cismadores profundos em seu caminhar – não se imaginam observados – equilibram-se em beiras, correm e param, apanham tudo que lhes emoldura e passagem, alternam breves corridas com pulos injustificáveis, engolem coisas extravagantes e, surpreendentemente, conseguem até chegar inteiros em casa. Em algumas circunstâncias, grudam-se nos jogos eletrônicos ou no computador; em outras, se largam inertes e estáticas diante da televisão.

As crianças nessa fase, dos sete aos onze anos de idade, um pouco mais, um pouco menos, apresentam-se no estágio de desenvolvimento cognitivo e habilidades mentais o que Piaget denomina “operações concretas”. Podendo fazer inúmeras coisas que quando menores não podiam, e por isso se tornam estranhas e tão fascinantes. 

Em geral, são agora capazes de operar símbolos da mesma forma como na fase anterior manipulam objetos. As palavras, os números e as pessoas, então, ganham significado especial e se incorporam a sua vida como jamais antes podia acontecer.

A imensa diferença entre a manipulação de coisas e de símbolos

Os números, por exemplo, entre as crianças pequenas, alcançam apenas o limite do que percebem; elas sentem que “um” não é a mesma coisa que “três”, mas jamais poderiam imaginar que cem mil são mais que quatrocentos. Já a partir da fase operacional concreta conquista-se o senso real dos números. O cérebro, que antes divagava entre a certeza concreta do um e do mais que um, ganha direito ao mistério dos milhares e desenvolve convenções fantásticas.

Tal como o número, as palavras deixam de se referir a coisas palpáveis e “assumem horizontes antes impensáveis”. Essa operação cerebral permite um novo nível de realizações, sonhos e fantasias dando origem ao pensamento mítico com que operam para entender “os mistérios”, abrindo caminhos para novas aquisições intelectuais e interpessoais.

Nesse estágio, dos 6 aos 12 anos, descobrem a capacidade de “operar seguindo regras”, que representará, para todo o sempre, a base do intercâmbio social duradouro.

Bom adulto

É chegada a hora maravilhosa de conclama-las a organizar “combinados”, roteiros de trabalho descobrindo que a maneira de se comportar ideal é aquela que obedece às convenções que democraticamente se construiu.

O bom adulto, nessa hora, não é o que estabelece limites, mas o que ajuda a criança a construí-los; não é aquele que a toda hora sabe apenas dizer “não”, mas quem encaminha a criança para dizer não a si mesma. Perder essa oportunidade constitui imperdoável lapso contra a educação.

A família e a escola precisam caminhar lado a lado, pois esta é tarefa de educadores. O processo só se concretiza com trabalho conjunto, valores e linguagens coerentes .

Quando uma criança aprende a construir e dominar as regras, conquista o pensamento silogístico, característico pela riqueza de conexões que é capaz de fazer, e está pronta para a educação formal, descobrindo que existem regras fonéticas, regras de escrita, regras de aritmética. 

Aprender regras possibilita poder participar de jogos complexos, criar seus próprios jogos, ordenar as linhas de seu destino. Enfim, tornar-se realmente pessoa.

Impossível afirmar que essa fase, dos 6 aos 12, é a mais linda fase do pensamento humano, posto que essa beleza seja inesgotável em todas as ocasiões desde o nascimento, mas seguramente é uma fase linda!

Felizes são as crianças que podem contar com adultos disponíveis para ajudá-las na construção das regras, adultos pacientes que explorem essa incrível competência mental, que apresentam neste momento, para construir um ser efetivamente social.

A dinâmica de uma classe Montessori oferece a possibilidade do exercício contínuo para a construção das regras, se construído um espaço de interações heterogêneas e democrático, onde todos devem ter direitos respeitados e responsabilidades, um espaço de exercício e de construção como também deve ser o da família.

Algumas dicas que podem ajudar!

😍 Substitua o hábito de “falar” com os filhos e descubra o prazer de “conversar”. Abandone a comunicação de apenas recados ou respostas monossilábicas para descobrir opiniões, crenças, impressões. Nesta fase o grande educador é o imprescindível aprendiz.

😊 Associe alta expectativa como carinhosa tolerância. Encoraje seus filhos a dominar tarefas e desenvolvê-las, mas saiba compreender as limitações e não faça das mesmas ícones de fracassos ou culpas.

🚵 Faça do lugar das crianças um ambiente estimulante. Proponha jogos, lance desafios, organize enigmas, invente passeios e brincadeiras. Incentive comportamentos imprevisíveis, dê muitos exemplos, raramente com palavras, principalmente com ações. Ensine seu filho a tocar, ouvir, cheirar, olhar, sentir… Faça-o descobrir o encanto da natureza e o fascínio oculto em toda paisagem.

👲👳 Exponha a criança à diversidade cultural, elimine preconceitos. Ensine-a com exemplos a perceber que as pessoas são diferentes, mas que sua singularidade não expressa necessariamente “certo ou errado”.
Mostre que homens e mulheres são iguais nos seus direitos, seus deveres e na validade dos seus sonhos. Saiba reconhecer, com humildade e espírito de superação os próprios erros.

👪 Faça da criança seu companheiro (etimologicamente = a que divide o pão). Não exerça controle rígido, aprenda a confiar com limites. Seja firme, mas extremamente sensato. Estimule-a a nomear seus sentimentos e aprenda a legitimar suas emoções. Ajude-a a perceber suas responsabilidades e seus compromissos, apoiando-a no que for preciso mas possibilitando o exercício. Converse abertamente sobre sexo, amor, paixão, desejo, guerra, droga. Tente libertar-se de suas “amarras”.

🙋 Ensine seu filho a ser um estudante. Mostra como é possível administrar o tempo, ensine a consultar dicionários, invente pesquisas, faça junto com sua criança para que ela possa treinar procedimentos com você, discutir opiniões, anime suas leituras, participe de seus programas. Mostre como você vê e pensa sobre as coisas, ensine-a a respeitar outras formas de emoção, beleza ou entusiasmo.

📚 Ajude seu filho a ser um leitor criativo. Leve-o à bibliotecas, fale com entusiasmo, de livros que leu, ensine a procurar a etimologia das palavras, leia e releia seus livros favoritos para a criança, peça a ela que leia trechos de livros para você, descubra com seu filho os muitos estilos de leitura até encontrarem aqueles com que se identifiquem, nunca deixe faltar material para escrever, para pintar ou desenhar (estas são formas de expressão que devem ser muito excitadas)… Se puder, disponibilize um computador e construa com seu filho “arquivos” com suas produções: diário, produções textuais, pesquisas, desenhos… Use jogos exploradores da metalinguagem.

Acredite que a criança é única e que o tempo rapidamente rouba-a de você.

Lembre que sua criança está construindo o adulto que um dia a há de ser!

Bibliografia

Duska R & Whelan M 1994, O desenvolvimento moral na idade evolutiva – um guia a Piaget e Kohlberg. São Paulo, Ed. Loyola.
Montessori, Maria, Da infância à Adolescência, Zig editora, Rio de Janeiro, 2006.
Montessori, Maria, L’autoeducazione nelle scuole elementare, Garzanti, Italia, 1950.
Revista Psicologia, Janeiro, 2008.

Confira outras matérias do blog clicando aqui

Siga a Aldeia nas mídias sociais clicando aqui