O que todos nós podemos aprender em um ambiente Montessori?

Para muitos, a ideia de um ambiente Montessori é ainda alguma coisa relacionada à primeira infância. Algum tipo de escola vista, talvez, como alternativa e um pouco privilegiada.

Quando meu filho mais velho chegou à idade pré-escolar, e depois o mais novo, eu os matriculei numa pré-escola Montessori.

Naquela época, eu era professora na Educação Básica da rede pública de ensino. Fui, aos poucos, ficando mais familiarizada com a filosofia de Maria Montessori, pioneira há mais de cem anos na Itália, e gostei.

Gostei tanto que foi aí que comecei a estudar sobre Montessori; estávamos em 1975 e o primeiro curso que fiz, na mesma escola em que meus filhos estavam matriculados, fez com que buscasse outros e outros. E continuo encantada, estudando Montessori para sempre!

Em 1978, nasceu a Aldeia Montessori, a escola que dirijo desde então. É nesse espaço e do contato diário com as crianças que vou descobrindo mais, cada dia, sobre o que um ambiente Montessori pode nos ensinar. Desde 2007, dedico-me também à formação de professores com base no método Montessori.

Percebo que o que chama atenção, à primeira vista, em uma escola Montessori são suas salas de aula. Lindas e coloridas, pela diversidade de materiais dispostos criteriosamente em estantes abertas. Elas são projetadas para serem simples e organizadas, de maneira que tudo possa ser facilmente utilizado pelas crianças. Isso encanta!

Outro aspecto que surpreende é a atitude dos alunos: na maioria das vezes, eles estão focados na atividade que realizam, quer sejam miúdos ou já maiores.

Começamos pelas classes de 0 a 3 anos. Nelas, a motricidade e a linguagem são o foco do desenvolvimento das crianças e elas têm ali também as primeiras experiências sociais, convivendo em grupo. Elas interagem entre si e o ambiente se mostra calmo.

Cada uma escolhe sua atividade, por vezes experimentam pegar o material que o amigo está usando. Então, a professora observa e intervém se necessário.

A professora pode também estar observando o grupo, ou estar com um pequeno grupo, apresentando um material a uma criança. Alguém pode molhar as plantas ou cuidar do aquário, pode se entreter com um livro de histórias, ou pode observar o trabalho de um amigo.

Isso é geralmente o que encontramos também nas classes de 3 a 6 anos, com a diferença de que nesse ambiente, as crianças estão voltadas para novas aprendizagens. Além disso, o foco da linguagem expande-se para a linguagem escrita e a motricidade vai se refinar em diferentes situações. Ela desperta para o conhecimento do mundo, além do ambiente circundante e a Matemática começa a fazer parte de suas investidas.

Sem dúvida, o caminho de toda essa aprendizagem é a via sensorial e o movimento. Mas em qualquer que seja a classe, o burburinho do trabalho das crianças é harmonioso, “um zunzum de trabalho”, como costumo dizer.

Nas classes de Ensino Fundamental, o trabalho dos alunos é bastante rigoroso. Eles pesquisam sobre temas de sua escolha, que tanto podem envolver dinossauros, tubarões, sistema solar ou o período colonial do Brasil. Também podem  saber mais sobre outro país ou continente. Mesmo crianças menores, de 6 a 9 anos, podem fazer multiplicações e divisões de vários dígitos, discutir sobre vários assuntos e escrever sobre o que pesquisam.

Mas o que torna um ambiente Montessori tão especial?

Respeito ao ritmo de cada criança

A diferença mais notável entre uma escola tradicional e uma escola Montessori é que os alunos se movem em seu próprio ritmo. Em vez de participar de uma aula dirigida pelo professor, na qual todos os alunos realizam as mesmas tarefas e são colocados no caminho para atingir o mesmo objetivo acadêmico todos os dias, cada aluno trabalha em lições precisamente ajustadas ao nível da habilidade atual. São eles que escolhem as lições para fazer.

No Ensino Fundamental, existe um “combinado” com as lições da semana. Eles podem, entretanto, realizá-   -las na ordem que quiserem e pelo tempo que quiserem.

Se um estudante está realmente envolvido com um material de Matemática, por exemplo, ele não é interrompido por gastar muito tempo na atividade. E se um aluno demonstrar um interesse particular em um tópico, digamos o “rio Amazonas”, ele incorpora esse tópico, enquanto ainda cumpre as metas curriculares.

Classes de idades mistas

Maria Montessori acreditava que as faixas etárias mistas eram de grande benefício para os alunos, fortalecendo a colaboração e a aprendizagem entre os pares. Esse é um fato preponderante no desenvolvimento social e emocional, ampliando as relações interpessoais.

Os alunos mais velhos assumem papéis de liderança naturalmente e ajudam a definir o ambiente de trabalho. A cada tempo os papéis se diversificam e todos têm a oportunidade de liderar e de serem liderados.

Eles também encontram maneiras de liderar. Seja pelo conhecimento crescente em uma área específica, um talento especial ou com seu próprio conjunto exclusivo de habilidades sociais.

Flexibilidade

Ter um cronograma regular de atividades diárias não significa ser rígido para acomodar eventos especiais que podem acontecer. Desde atividades realizadas no espaço externo, em contato direto com a Natureza até as aulas de campo. Receber visitas ou preparar juntos o lanche do dia e ainda aproveitar uma novidade trazida por um amigo para aprender mais sobre o assunto.

Esse tipo de flexibilidade é algo que pode trazer enorme benefício: capacidade de aproveitar as oportunidades à medida que elas surgem, ser criativo etc.

O potencial humano como foco na educação

Embora os alunos façam o trabalho acadêmico todos os dias, o currículo Montessori expande sua visão numa educação integral, holística, na qual os desenvolvimentos emocional, social, motor e acadêmico têm o mesmo valor.

Quando as pessoas olham para um programa acadêmico, olham especificamente para as competências cognitivas. Mas todos nós sabemos que o acadêmico é insuficiente para toda a criança — aliás, para qualquer pessoa.

Sempre temos o foco na criança por inteiro: independência, capacidade de concentração, empatia, resiliência, capacidade de compartilhar espaço, respeito pela comunidade, capacidade de solucionar conflitos, competência para expor suas ideias e sustentá-las, entre tantas outras que vão se desenvolvendo à medida que a cresce.

Visão e Educação Cósmica

“A visão de MONTESSORI, do mundo, tem uma dimensão cósmica porque ela inclui tudo: MONTESSORI olha o mundo, vê o mundo numa escala enorme, quer dizer, vê o universo com todas as suas inter-relações. A visão de MONTESSORI também é cósmica porque ela olha a humanidade em sua totalidade através do tempo. Ela vê os seres humanos guiados por uma finalidade desde a época de sua aparição; vê a humanidade ao mesmo tempo adulta e criança; vê ainda o indivíduo ao mesmo tempo em sua unidade e nas suas diferenças de desenvolvimento durante as diversas etapas ou estações da vida, considerando cada indivíduo como uma parte do universo.”

(Pietro de Santis, em “A Paz em Montessori”, Encontro internacional de líderes, Rio de Janeiro, 2002).

Educação como ciência

Maria Montessori defendia que a educação deve resultar de uma abordagem científica capaz de respeitar as leis do desenvolvimento da criança e adolescente e suas fases evolutivas.

“Se a ciência começasse a estudar os homens, conseguiria não só fornecer novas técnicas para a educação das crianças e dos jovens, mas chegaria a uma compreensão profunda de muitos fenômenos humanos e sociais que estão ainda envolvidos em espantosa obscuridade.

A base da reforma educativa e social, necessária aos nossos dias, deve ser construída sobre o estudo científico do homem desconhecido.”

Maria Montessori, da Infância a adolescência.

Ambiente preparado

O ambiente preparado, segundo Montessori, é aquele preparado pelo adulto à luz da ciência do desenvolvimento humano.

A sala de aula Montessori usa espaço físico e tempo que permite a concentração e design que permite que as crianças encontrem, escolham e usem materiais para aprendizagem com autonomia.

A chave do sucesso de uma classe Montessori está em criar um ambiente propício ao protagonismo da criança e do adolescente, com aprendizagem independente ou autoeducação, como costumamos dizer.

Professores preparados

Para dirigir uma classe Montessori, o professor precisa estar preparado: conhecer sobre desenvolvimento e aprendizagem, sobre as estratégias didáticas do Sistema Montessori e ser capaz de projetar e manter o ambiente que nutrirá a curiosidade de suas crianças, além de guiá-las pelo caminho a percorrer no seu processo de aprendizagem.

Deve ser um observador para poder seguir a criança e oferecer a ela o que precisa para ir adiante.

Para Maria Montessori, o professor é o cientista que cuida do “laboratório da vida” que cada classe representa.

Ensinar ensinando

Essa filosofia é aparente na forma como os alunos são tratados. Se uma criança está se distraindo e tendo problemas para se concentrar, em vez de repreendê-la, cabe ao professor reacender o interesse dela, observar para determinar o que a está confundindo ou ajudá-la a encontrar outra tarefa que seja mais atraente, nutrindo sua curiosidade.

Na prática da observação, há a identificação dos pontos em que a criança precisa de ajuda e a retomada do processo de aprendizagem no ponto em que ela encontrou algum obstáculo. Sem corrigi-la, apresenta a maneira correta para que ela própria possa perceber seu erro e construir o acerto.

Os alunos também recebem muita responsabilidade para manter a sala de aula em ordem e limpa, planejar refeições e lanches e resolver os problemas à medida que surgem. Todos esses itens não são vistos como distrações do currículo, mas partes importantes dele, exercícios de autonomia que fortalecem a autoestima e a autoconfiança do aprendiz.

O que todos nós podemos aprender com um ambiente Montessori?

Aplicado desde 1907, revolucionou a concepção de escola, “entregando” o protagonismo ao aluno; sobreviveu a tantas outras abordagens de ensino e hoje serve de inspiração às escolas inovadoras em todo o mundo.

Sua base científica comprovada pelos estudos da Neurociência ratifica os caminhos escolhidos pela Dra. Maria Montessori.

E do jeito que as coisas estão ultimamente, pode ser hora de procurar por uma maneira totalmente nova de fazer as coisas. Mesmo que esse “novo” caminho seja realmente um clássico.

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Texto de Márcia Righetti, originalmente publicado neste link.

Márcia, além de fundadora e diretora pedagógica da Aldeia Montessori, é pesquisadora, especialista no Sistema Montessori,  coach de formação Montessori e diretora do Centro de Estudos Montessori.

Responsabilidade e liberdade no contexto montessoriano

Responsabilidade e liberdade, em um ambiente montessoriano, têm conceitos amplos e relacionados. Mesmo assim, quando se escolhe uma Escola Montessori para seu filho, muitas vezes o conceito de “liberdade”, da qual tanto se ouve falar sobre esse tipo de escola, pode não estar claro pra você.

Pensa-se que a relação das crianças com o ambiente, com as outras crianças e com os adultos é construída num processo “livre” e que elas fazem o que querem…

Que engano!

A liberdade da qual nos fala Montessori está relacionada às conquistas pessoais ou coletivas que se sucedem no desenvolvimento da criança, no caminho de aprender a fazer escolhas e responsabilizar-se por elas, de aprender a avaliar a validade de seus atos, de aprender a ser e se relacionar adequadamente com todos, visando ao bem-estar comum, de apresentar comportamentos apropriados a cada ambiente e em cada momento.

É isso que, do ponto de vista de Maria Montessori, representa ter liberdade – “sendo parte do todo, buscar a harmonia interior e interagir no todo de forma positiva”.

Ajudar a criança a construir essa liberdade é o papel dos adultos.

Sem dúvida alguma, ela inclui a responsabilidade, primeiro consigo própria para depois poder expandi-la até perceber-se como parte do Universo — caminho longo, talvez de uma vida…

Em uma Escola Montessori, é na prática diária, desde a classe dos pequeninos, o “Nido”, e/ou no pré-escolar da Educação Infantil que o terreno começa a ser preparado, num trabalho que tem início com a educação dos movimentos, um conjunto de atividades que permite que a criança desenvolva habilidades e construa repertórios que a habilitem para uma atuação cada vez mais autônoma e apropriada no seu ambiente.

Ativa no seu processo de autoconstrução, aprendendo a fazer para poder ser, a criança vivencia as muitas possibilidades de exercício que o ambiente estruturado que uma Escola Montessori oferece. Assim, em atividades de livre escolha, a ação da criança vai se organizando e é assim que sua liberdade também vai se ampliando.

Em algumas situações, que causem dano ou risco à própria criança, ao ambiente ou a outrem, deve haver um cuidado especial. Deste modo, a intervenção imediata do adulto é necessária para mostrar à criança a maneira correta de agir. Ensinar ensinando!

Muitas vezes o que acontece, por parte dos adultos, é uma sucessão de “nãos” e de ordens que não constroem: “não faça isso!”, “fique quieto!”, “desça daí!”, “não bata a porta”, “não corra”! Expressões que apenas interrompem ou impedem a ação da criança e a ensinam a dizer muitos “nãos”…

Ensinar, ensinando requer que se demonstre à criança a maneira correta de agir:

– Para sair, caminhamos…
– Para fechar a porta, faço assim…
– No sofá, nós nos sentamos!
– No cinema, ficamos em silêncio!
– Na rua, as crianças precisam caminhar junto ao adulto!
– Para falar, cada um espera sua vez!

Muitas informações vão sendo vivenciadas com a criança; assim, ela adquire atitudes adequadas e constrói bons hábitos.

Ao refletirmos sobre liberdade, cremos que ela está inversamente relacionada à disciplina e aos limites, mas do ponto de vista montessoriano é justamente o contrário.

Só é livre aquele não se sente atado pelos limites, que reconhece os que deve transgredir para conquistar seu crescimento pessoal, que respeita os limites que lhe são necessários para uma convivência harmoniosa em todos os planos de relações: consigo próprio, com o outro e com o ambiente. E esse, sem dúvida, é aquele que se autodisciplinou.

Toda essa construção culmina na formação do caráter e é por isso que devemos estar atentos às crianças pequenas, que estão desenvolvendo a concepção de bem e mal. Portanto, essa é, para Maria Montessori, a primeira lição que lhes deve ser dada. Devem ser cuidadas para não confundirem o bem com a passividade ou a inatividade e movimento e ruídos com o mal…

Crianças são puro movimento e por vezes ruidosas, precisam de espaço para usar a energia que trazem consigo, mas não se justifica que possam agir desrespeitando os outros.

Portarem-se de maneira indevida em diferentes espaços, aos gritos e correrias, não se justifica por serem crianças.

É desde pequenas que elas precisam aprender os comportamentos sociais — a isso nós chamamos de “Lições de Graça e Cortesia”. Portanto, somos nós, os adultos, que cuidamos de lhes ensinar as regras sociais da nossa cultura.

Para termos liberdade com responsabilidade, precisamos conhecer e respeitar os limites em cada situação de vida, ou identificar quando precisamos transgredi-los, superando-nos, com determinação, quando isso conduzir ao aprimoramento pessoal.

Liberdade só se aprende com verdadeiras lições de disciplina e responsabilidade!

“O homem é tanto mais livre quanto for sua capacidade de escolher as coisas que lhe fazem bem.”
– Maria Montessori

Por Marcia Righetti — Pesquisadora; Especialista no Sistema Montessori; Coach de formação Montessori; Fundadora do Projeto Pedagógico da Aldeia Montessori, que dirige há 40 anos, e do Centro de Estudos Montessori do Rio de Janeiro; Sócia fundadora da Organização Montessori do Brasil.

Conhecer para ajudar: um desafio para quem educa!

Muitas vezes, nos pegamos julgando crianças pequenas como agressivas. Mas, o que assim denominamos pode ser apenas uma forma de relacionamento que ainda não encontrou o equilíbrio, é um comportamento reativo que se expressa. Este é um assunto bastante amplo e podemos notar suas raízes desde o início das relações das crianças ainda na Educação Infantil.

Muitos adultos, por desconhecerem as características do desenvolvimento infantil, atribuem o peso das ações deles às relações entre as crianças, e elas são muito diferentes…

Como adultos, para cuidar e educar nossas crianças, precisamos saber o que diz respeito a uma determinada faixa etária, além do que está fora dos padrões esperados; por isso, é tão importante conhecer sobre o desenvolvimento infantil, buscar leituras que possam ajudar a entender as crianças e os comportamentos que elas apresentam.

Jean Piaget, psicólogo respeitado por sua teoria de desenvolvimento do pensamento; contemporâneo e parceiro de Maria Montessori, pois foi presidente da Associação Montessori Suíça; é sempre uma boa referência, indicando como as crianças entendem o mundo.

Do nascimento aos dois anos de idade, a criança se apresenta na fase sensório-motora, explorando e se relacionando com o mundo através dos movimentos e dos sentidos.

Assim, Impulsos reflexos fazem com que leve tudo à boca, e aí podem surgir as mordidas… Sem intenção de agressividade, apenas fruto de um impulso reflexo em busca da exploração, que vai sendo cuidado com novos estímulos e a “fase passa”. Uma criança, com até dois anos de idade, que morde as outras não pode ser rotulada como agressiva. Ela ainda não sabe usar a linguagem verbal, e a linguagem corporal acaba sendo mais eficiente.

Nessa fase, a criança é egocêntrica e entende que é o centro do mundo. Que todas as suas vontades podem prevalecer, que o mundo funciona em função dela. Assim, ela ainda não tem a capacidade de compreender que outras pessoas podem ter pontos de vista e sentimentos diferentes do seu. A disputa por objetos ou pela atenção das pessoas queridas é uma das formas de relacionamento.

Na intenção de obter um objeto de desejo o mais rápido possível, já que não consegue verbalizar com fluência, os pequenos podem morder e empurrar, sem a intenção de atingir o outro, mas tão somente com o intuito de satisfazer sua vontade.

Essa fase de disputa é natural no desenvolvimento humano e, com quanto menos ansiedade for tratada, mais rápida e tranquilamente será transposta.

Os cuidados dizem respeito à forma como se conduzem as orientações à criança e às estratégias utilizadas de forma construtiva.

Muitas vezes, o que é normal no desenvolvimento humano pode se desvirtuar em rótulos e punições. Por isso é tão importante CONSTRUIR os limites no comportamento e no relacionamento social com as crianças.

Entendemos que é construindo valores que os resultados são mais bem atingidos: Qual é meu espaço e qual é o espaço do outro, o que dói no outro, o que desrespeita o outro, o que agride o outro.

Aos adultos cabem intervenções, quando necessárias forem, evitando que se machuquem e explicando que a atitude não é correta, não permitindo que se repitam; construindo limites de forma positiva, sem punições ou premiações. As crianças ficam felizes quando se sentem capazes de vencer desafios e são reconhecidas no seu esforço — este é seu maior “prêmio”. Cuidamos para saberem como nos importamos com o que fazem, que cada uma é importante para nós e caminhamos lado a lado, a fim de que vençam cada etapa e seus desafios naturais.

Um comportamento reativo pode aparecer ainda em relação a uma frustração, às mudanças ocorridas, e manifesta-se com birras, gritarias e chutes. Impulsos ainda não controlados, mas que precisam ser educados. Os pais não podem permitir que seus filhos batam neles ou gritem com eles, pois certamente experimentarão os mesmos comportamentos com outras pessoas, crianças ou adultos. Para educar é preciso firmeza, persistência, paciência e amorosidade. Graça e cortesia são lições que precisam ser dadas pelos adultos.

Por volta dos três anos, as crianças já acrescentaram milhares de palavras ao seu vocabulário e começam a descobrir o prazer em brincar com o outro e se comunicar.

Até os sete anos, já devem ter deixado para trás o egocentrismo ampliado a sua socialização. Dos dois aos sete anos, devem ser estimuladas a expressar oralmente suas vontades, opiniões e sentimentos e a buscarem a solução dos pequenos conflitos do cotidiano através do diálogo. O melhor caminho para conseguir isso é que os adultos tenham essa mesma conduta no trato com as crianças, intervindo amorosa e firmemente quando usam a força física para conseguir o que desejam. Tratando as crianças de forma gentil, sem gritos ou ameaças. Assim, elas aprenderão com os adultos a serem gentis!

Alguns comportamentos do mundo adulto podem aparecer nessa época como discriminação, preconceito e apelidos.

Aos pais e educadores cabe pontuar a não aceitação deles e cuidar para que eles próprios não sejam o modelo para a criança.

Seja criticando o outro que é gordo, que é mais lento, que é mais tímido. Quantos já ouviram que “perderam a língua” e isso não foi nada agradável… E ouviram de adultos… E as crianças repetiram…

Hoje, pelas novas descobertas científicas, sabemos que em nosso cérebro os neurônios espelhos são ativados quando uma ação é realizada ou quando simplesmente observamos outra pessoa realizando essas mesmas ações. Essa reação explica o que Maria Montessori denominou como “mente absorvente”, referindo-se à maneira como as crianças aprendem e se adaptam ao mundo, espelhando as ações que vivem em seus ambientes sociais. Assim, as crianças aprendem também a empatia ou a antipatia, vivenciando a ação do outro como se fosse dela própria.

A escola é o primeiro grupo social no qual a criança começa a fazer parte do coletivo.

Via de regra, em casa, a criança é sempre querida, amada e compreendida. Isso não acontece no convívio social com seus pares pois precisa conquistar amigos e inserir-se no grupo. É nesse espaço que se depara com situações de esperar ou ceder a vez, respeitar a vontade do outro, respeitar o espaço do outro, compartilhar, ajudar… Nem sempre é coisa fácil se sempre foi o “reizinho da casa”, como o título do livro do Dr. Gustavo Teixeira que os adultos devem ler. Nesses casos, as ações reativas podem se transformar em agressividade.

A personalidade da criança se forma até os seis anos de idade. Por isso, toda experiência e a qualidade com que foi vivida nessa fase é de fundamental importância. Estímulos adequados, reconhecimento, afeto, compreensão têm resultados muito mais rápidos e menos estressantes do que “bronca, castigo, sofrimento e indiferença”. Cuidar de cada etapa com tudo o que elas exigem.

É muito importante que os adultos observem as crianças sem julgamento e assim, ajudem-nas a encontrar o equilíbrio e a harmonia nas suas ações; construam com elas limites firmes e de maneira amorosa e principalmente, lembrem-se de que “para educar, é preciso educar-se”. — e esse é o papel do adulto.

Leituras indicadas:

Tania Zagury — Limites sem trauma.
T. Berry Brazelton e Joshua D. Sparrow — A criança dos 3 aos 6 anos.
D. W. Winnicott — A criança e o seu mundo.
Gustavo Teixeira — O reizinho da casa.
Maria Montessori — Pedagogia Científica.
Daniel Goleman — Inteligência emocional e a arte de educar nossos filhos.

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Por Márcia Righetti – Diretora Pedagógica da Aldeia Montessori

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Novo ano letivo na Aldeia Montessori: tudo começa com um abraço!

Em todo início de ano letivo, recebemos nossas crianças em suas novas classes… E cuidamos de cada detalhe para acolhê-las!

A começar pelo ambiente físico, para que seja seguro, confortável, inspirador da cultura e belo; preparado de forma a nutrir a curiosidade de cada aprendiz que desfrute dos nossos ambientes.

O espaço socioafetivo é outro item que merece nossa atenção.

Mesmo sendo uma escola Montessori, na qual as crianças permanecem numa mesma classe geralmente por dois ou três anos, muitas mudanças acontecem. Se a criança inicia um novo ciclo ou partilha uma classe realmente nova, as transformações são ainda mais significativas.

São muitas novidades e muitas emoções; tudo isso merece sempre, da nossa equipe, um cuidado especial.

Zelamos por todos os aspectos, com cuidados à maneira Montessori, nesses quase 40 anos de prática; a fim de que nossas crianças vençam com tranquilidade o processo de adaptação a cada ano letivo.

Para os pais, pode parecer que a adaptação aconteça apenas no ingresso da criança na escola. Mas como seres humanos que somos, nós nos adaptamos ao longo da vida a diferentes tipos de situações e é em criança que construímos nossa capacidade de enfrentar mudanças pela vida afora. Seja posicionando-nos diante do novo ou ainda construindo nosso espaço e novos relacionamentos.

Entendemos que o ritmo da criança precisa ser preservado. Sabemos ainda o quão importante é, para ela, processar as novas informações e encontrar a melhor forma de agir.

Professoras, recreadoras e todo pessoal envolvido nesse processo tomam conhecimento da história de vida da criança para melhor atendê-la — seus medos; necessidades; alegrias; preferências… Tudo o que foi registrado na anamnese ao chegar, nos registros de entrevistas realizadas anualmente e que fazem parte de sua história na Aldeia Montessori.

Em cada início de ano letivo, a adaptação é um momento de transição em que a criança vai se habituando à nova rotina do ambiente escolar, com os amigos antigos e os novos, sejam adultos ou crianças. Seu ponto de partida são as referências que traz, assim como carrega para a vida as referências que constrói a cada ano.

No cotidiano escolar, cada um vai estabelecendo vínculos afetivos com adultos da sua classe, com coleguinhas, com seu ambiente e pouco a pouco, a criança se sente mais segura. 

Ela recebe de nossa equipe ajuda a sua medida para apoiá-la em cada novo passo. A família é orientada e cuidada da mesma forma, para que os vínculos entre a família e a escola sejam fortes e gerem confiança.

Por vezes, na separação dos pais, quando chega à escola, pode acontecer um chorinho…

Para que se construa confiança, é importante dizer sempre a verdade aos pequenos, com explicações claras e objetivas cercadas de carinho, prometendo somente o que se pode cumprir.

Percebemos que, para os que estão chegando, a presença de um adulto familiar pode ser uma ajuda indispensável. Assim, sempre orientamos às famílias que o mesmo adulto deve acompanhar a criança durante o processo inicial de adaptação. Essa é também uma ajuda à equipe pedagógica, que está conhecendo as novas famílias.

Mesmo com choro, despedir-se de seu filho é fundamental e vai ajudá-lo a perceber que a separação tem fim e, num certo tempo, o papai, a mamãe e/ou outro familiar vão “aparecer” e levá-lo para casa…

Só não vale interromper a caminhada da criança que se encheu de coragem e confiança e que entrou sozinha em direção a sua classe para pedir um beijinho que ficou faltando. Pode ser, então, que a coragem “acabe” e o chorinho torne a acontecer!

Se a criança é pequena, o acompanhamento dos pais é essencial nesse processo. Construir e fortalecer vínculos com a escola escolhida para acolher seu filho deve ser a maior conquista do processo de adaptação no que tange às famílias.

Se a presença dos pais não é possível nesses casos, um adulto de referência deve estar disponível para permanecer na escola enquanto for necessário para a criança se sentir segura.

Caminhar juntos — família e escola — é, sem dúvida alguma, a melhor maneira de apoiar crianças no seu processo de adaptação. Tirar dúvidas; informar o que é importante; cumprir os combinados e chegar na hora aprazada para pegar a criança na escola são também detalhes que devem ser cuidados por todos — e quem sai ganhando, certamente, é a criança.

Afinal de contas, é por ela que nos unimos — família e escola. Ela é o foco da nossa atenção e dos nossos cuidados!

De toda maneira, nós, da Aldeia Montessori, estaremos de braços abertos para você e seu filho. Estaremos preparados para tornar essa experiência do início de ano letivo algo de positivo nas muitas construções que fazemos no caminho que escolhemos trilhar juntos o da educação das crianças, com toda a segurança física e emocional que tem sido nossa marca nesses 40 anos de atuação.

Como é bom estarmos juntos!

O que é Montessori: conheça mais sobre o método

Segundo Alicia Renton, se perguntassem à Maria Montessori o que é “Montessori”, ela responderia:

– Montessori sou eu.

Alicia Renton foi reconhecida pela American Montessori Society com o prêmio “Legado vivo”, atribuído aos montessorianos que se dedicam a propagar o legado de Maria Montessori. Mexicana de nascimento, radicou-se no Colorado (EUA) atuando como guia, palestrante internacional e formadora. Ela esteve no Brasil para a Conferência Montessori Latino- Americana promovida pela Organização Montessori do Brasil, onde tive oportunidade de conhecê-la e aprender com ela.

Das respostas simples de Montessori às indagações de seus contemporâneos até os dias de hoje, o trabalho da médica italiana vem sendo cada vez mais reconhecido.

Já são mais de cem anos de aplicação de pressupostos, estratégias didáticas e filosofia de educação iniciada em 1907 na Casa Dei Bambini, do bairro de San Lorenzo, em Roma.

Seu principal instrumento de trabalho, como médica e cientista que foi, antes de abraçar a Pedagogia, a observação. Investigar o que as crianças mostravam em seu processo de desenvolvimento, nas formas como aprendiam e como estabeleciam as relações no mundo. Uma escuta profunda do universo infantil.

Assim, como consequência, nasceu sua primeira obra dedicada à educação, “O método da Pedagogia Científica aplicado à educação infantil na Casa dei Bambini”, lançado em 1909 pela Casa Editrice S. Lapi, de Città di Castello, obra publicada pelo mundo afora e reeditada, em 1950, sob o título de “A descoberta da criança”.

Além disso, de lá para cá, a ciência esclareceu e ratificou o que a Dra. Montessori – sem dúvida uma visionária, com são os cientistas – apontara como princípios básicos para uma educação que vivenciasse plenamente o conceito de educação: trazer para fora o que está dentro.

Com o advento da Neurociência, por volta de 1970, muitas afirmações de Montessori sobre o desenvolvimento e o funcionamento do cérebro tiveram confirmação. Assim, pelos exames de imagem, o que muitas vezes nesse processo foi visto como crença confirmou-se como ciência.

Assim, pressupostos como uma educação ativa, um ambiente preparado e a livre escolha passam a permear projetos inovadores que se espalham pelo mundo. Além disso, a “escuta” das crianças e dos adolescentes e a função de guia da professora, ajudando à medida que cada um precisa se posicionar diante das oportunidades da vida, também cresceram.

Registros feitos numa documentação pedagógica que foge ao padrão dos boletins, resultados de provas que são cada vez mais abolidos do cenário da educação.

O processo educativo passa a ter o protagonismo da criança e dos jovens em sistemas educacionais espalhados pelo mundo, sementes montessorianas que germinam vigorosas.

Tenho visitado escolas por vários países e continentes e ao observar o encantamento dos educadores nas práticas que já fazemos há mais de cem anos, fico feliz com nossa escolha!

E se me perguntassem hoje o que é Montessori, respondo…

O legado de uma mulher que amava a humanidade, que se preocupava com a educação das crianças para que se construíssem como adultos éticos e competentes.

Que, como cientista, conhecia os processos de aprender que o cérebro desenvolve, que observou e investigou a criança e o desenvolvimento humano.

Baseando-se em seus estudos, os quais sempre dizia que deveriam ser continuados por seus seguidores; deixou uma rica documentação pedagógica para orientar aqueles que desejassem seguir seus passos na educação das crianças.

“Montessori” – hoje entendido como um sistema educativo, com partes que se integram e se completam para atender às diferentes características das crianças. Cada etapa do seu desenvolvimento natural tem como objetivo desenvolver o potencial humano para formar adultos éticos; ativos e assertivos que possam transformar o mundo num lugar melhor a cada dia.

Márcia Righetti é educadora, fundadora e diretora pedagógica da Aldeia Montessori.

Limites, disciplina e liberdade em uma escola Montessori

É comum recebermos para visitar nossa Aldeia famílias que buscam uma escola Montessori em nome da tão propagada “liberdade” que entendem que a metodologia oferece. Propaganda certamente não entendida, pois vejo essas famílias pensarem que seus filhos vão poder fazer o que quiserem na escola. Uma contrapartida do que parecem encontrar nas escolas que consideram “tradicionais”, nas quais muitas vezes não conseguem lidar com tudo que a criança precisa dar conta…

Porém, não é bem assim…

Liberdade, para Maria Montessori, está diretamente relacionada à disciplina, ao respeito e à competência para fazer escolhas. Ela diz que “o homem é tanto mais livre quanto for sua capacidade de fazer escolhas”; devendo agir de maneira assertiva, pois precisa conhecer as regras que regem um espaço social e que regulam a ética; respeitar o espaço do outro e desenvolver, entre outras funções executivas, o controle inibitório, que permite o autocontrole.

Para as crianças, liberdade é um exercício de disciplina que se desenvolve no dia a dia.

Quer seja na escola ou em casa, ter pequenas responsabilidades que contribuam para o bem-estar comum; aprender a esperar sua vez ou cedê-la ao outro; perceber que os outros também têm vontades e direitos que precisam ser respeitados e que nem sempre a vontade pessoal pode prevalecer.
Conquistar a liberdade é um processo que cada criança tem o direito de desenvolver com o apoio dos adultos. “A liberdade, do ponto de vista Montessori, também está relacionada ao direito de ser criança e de poder brincar. Isso porque brincadeira é trabalho de criança, de merecer do adulto as oportunidades de ajuda necessárias para que possa desenvolver seu potencial; descobrir seus talentos; ser respeitado em seu ritmo de desenvolvimento.”

As conquistas só vêm com a consciência do seu espaço e do espaço do outro; dos seus direitos e dos direitos dos outros; das suas responsabilidades e das responsabilidades dos outros, um processo de construção de limites.


Digo sempre que a disciplina da escola Montessori é fruto do exercício interno de cada criança, com o apoio dos adultos, no seu tempo e no seu ritmo.

Por isso, pode ser vista às vezes como a mais rígida, já que cada criança vai descobrindo, nas relações cotidianas, seu espaço de ação e o uso dele a torna livre – são suas escolhas a cada momento que vão ampliando.

Algumas crianças, considerando o princípio da equidade, forte característica numa escola Montessori, precisam de mais auxílio que outras. Aqui a ajuda que procuramos dar é na medida em que cada uma precisa.
Assim, caminhamos com as famílias para ajudar cada criança a desenvolver melhor seu potencial e constituir-se num indivíduo capaz de exercer e usufruir plenamente sua liberdade de “ser humano” – essa é nossa prática pedagógica.


O ambiente preparado de uma escola Montessori autêntica, com uma equipe em constante aprimoramento e famílias parceiras, as quais buscam os mesmos resultados e compartilham os mesmos valores, é sem dúvida o facilitador desse processo.

No cotidiano da escola e da família, os processos que se desenvolvem na infância são exercitados, descobrindo regras que podem ser questionadas; reconstruí-las se necessário; construindo com as crianças as percepções dos limites que levam naturalmente à edificação da disciplina e de um convívio social amável, no qual o respeito e a ética estão presentes. Para nós, esse é o verdadeiro sentido da palavra “liberdade”.

Márcia Righetti é educadora, fundadora e diretora pedagógica da Aldeia Montessori.

O que está por trás de um ambiente Montessori?

Há mais de cem anos, Dra. Maria Montessori percebeu que a curiosidade natural das crianças poderia ser o centro de uma educação que efetivamente desenvolveria suas capacidades verdadeiras.

Suas primeiras experiências envolviam crianças de zonas de risco, com necessidades especiais; porém, mesmo assim, os resultados surpreenderam todos naquele tempo.

Seus conhecimentos além da Pedagogia, como sua experiência na Psiquiatria, deram a Montessori uma visão da educação que apenas depois do surgimento da Neurociência foi ratificada.

Ela sabia que era preciso educar o cérebro!

E foi a partir desse diferencial de conhecimento e de seu propósito de favorecer meios para “educar o potencial humano” que desenvolveu estratégias, utilizadas ainda hoje por cerca de vinte mil escolas espalhadas pelo mundo.

A ação da criança, movida por sua curiosidade natural, em um ambiente preparado para que os estímulos sejam apropriados ao seu desenvolvimento (seja no aspecto cognitivo, psicomotor ou socioafetivo), é fator preponderante nesse processo, que conta ainda com professores treinados, observadores e prontos para apoiar cada indivíduo.

Para o olhar leigo, um ambiente Montessori é apenas encantador, com tantos “apelos” nas estantes para agradar as crianças.

Numa segunda análise, ele é visto como uma possibilidade de aprender brincando, escolher o que se prefere e um lugar de muita liberdade.

Mas quando o adulto observa o burburinho de uma classe Montessori, logo questiona: Cada um faz o que quer? Como a professora “controla” a turma? Às vezes parece uma “confusão” de crianças andando pra lá e pra cá… De que maneira a criança aprende trabalhando sozinha?

Um ambiente Montessori precisa ser observado criteriosamente, a fim de entendermos tudo o que sua criadora analisou e concebeu para oferecer às crianças as melhores condições ao desenvolvimento de seus potenciais.

Dra. Maria Montessori, antes mesmo da Neurociência, que surgiu por volta de 1969, foi capaz de propor um ambiente facilitador para o desenvolvimento das funções executivas, as quais são habilidades que favorecem todos os outros processos de aprendizagem dos seres humanos. Entre elas podemos destacar: a memória de trabalho que, com as informações registradas na mente, aplica-as em situações posteriores; a flexibilidade cognitiva; e a capacidade de pensar criativamente, ajustando-se às novas situações.

Assim, são essas habilidades que fazem as crianças se tornarem adultos capazes de manifestar o autocontrole, a tolerância, a resiliência e a perseverança.

E afinal, o que torna uma classe Montessori diferente?

É que, nesse cenário preparado com cuidado científico, se desenvolvem naturalmente as funções executivas. Ele é estruturado para o desenvolvimento harmonioso da criança em etapas, às quais Dra. Maria Montessori chamou de “períodos sensíveis”, oferecendo-lhes possibilidades de movimento, curiosidade, escolhas e descobertas, nas quais o uso dos sentidos (tato, olfato, visão e gustação) também é fundamental.

A professora demonstra o uso do material, mas é o material que “ensina” a criança…

Por exemplo: quando usa a Torre Rosa, a criança assimila o conceito de grandeza nas dimensões, entendendo o que é grande e o que é pequeno. Quando organiza o sistema solar com miniaturas representativas, entende como os planetas orbitam o Sol; ou ainda usando o jogo da “Longa Divisão”, percebe o processo de dividir grandes números em vez de decorar.

As crianças que construíram boas funções executivas têm um nível mais elevado de habilidades emocionais e sociais, tendendo a ser mais saudáveis* ao longo da vida.

Esse é um processo de construção que exige percorrer um longo caminho, claramente favorecido pelos aspectos do desenvolvimento natural nos anos pré-escolares (entre os 4 e 5 anos) e no início da adolescência – sem dúvida, com resultados comprovados!

*Neste caso, a palavra “saudável” se aplica ao conjunto cognitivo-emocional, não à condição médica.

Márcia Righetti é educadora, fundadora e diretora pedagógica da Aldeia Montessori.

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O Processo de Alfabetização: o caminho da criança do real ao ortográfico

O processo de alfabetização é por vezes uma grande preocupação dos pais; assim como é o vestibular, a busca pelo primeiro emprego ou foi o aprender a andar, a falar; ou seja, cada acontecimento que marca uma nova etapa a ser vencida no desenvolvimento natural dos filhos.

Na metodologia Montessori, ele se inicia no Berçário (Nido 1) e segue por todas as classes da Educação Infantil, até concretizar-se no 1º ano e aperfeiçoar-se no 3º ano do Ensino Fundamental, quando a criança completa sua fase de letramento.

Todo este processo é muitas vezes despercebido pelos pais, que enfatizam a etapa da explosão da alfabetização, principalmente do interesse por escrita e leitura, geralmente se dá por volta dos 5 ou 6 anos.

Entretanto, cada etapa desse percurso tem grande importância para as crianças.

Elas correspondem, como costumo dizer, à bagagem com que cada criança enche seu “baú de conhecimentos”; o qual, na época da formalização do processo de alfabetização, ela arruma, dando significado a tudo que colocou lá dentro.

Maria Montessori percebeu características especiais nos seres humanos, as quais tornam a criança capaz de determinadas aprendizagens em períodos específicos da sua vida; refere-se a essas capacidades temporárias como “períodos sensíveis para o aprendizado”. Aos poucos a criança decodifica o mundo, descobre a realidade à sua volta, nomeia objetos, atribui qualidades, conta, enumera, aprimora e amplia seu vocabulário.

É dessa forma que Montessori considera o processo de alfabetização: o caminho das representações do mundo que a criança faz, do real ao ortográfico. Um caminho que tem como “estrada“ o desenvolvimento natural da criança.

Pela metodologia Montessori, a criança constrói seu processo descobrindo que tudo o que vê ou sente pode ser representado; então, desenha e posteriormente escreve, aprendendo a usar a ferramenta da escrita: as letras.

As primeiras escritas são como desenho, palavras desenhadas, mas têm significado! Representam a leitura do mundo e permitem a comunicação. A escrita reflete o resultado de um processo de análise que a criança desenvolve para perceber como a sociedade usa “sinaizinhos”, as letras, para registrar mensagens. Depois, mais uma conquista: a leitura, que implica novamente decodificar os tais “sinaizinhos”.

Escrita e leitura são momentos diferentes de um processo da alfabetização que, na natureza humana, podem acontecer em ordem direta ou inversa; e cada criança tem seu tempo próprio para percorrer esse caminho.

Numa sala Montessori, os materiais de desenvolvimento apoiam esse processo natural. Lá, a criança manuseia as caixas de reconhecimento, as letras de lixa, os alfabetários, os cartões classificados de nomenclaturas, as caixas de leitura e realiza atividades que estruturam suas descobertas.

E quando a criança “explode” na escrita, muitas vezes esse processo não é compreendido pelos pais, pois o produto que apresenta não é comparável ao dos outros métodos.

Nestes, as crianças podem estar formando palavras com sequência de letras determinadas pelos adultos, que limitam o vocabulário e as possibilidades da escrita, mas que, de qualquer forma, estão todas “escritas” numa folha ou caderno, visíveis aos olhos dos pais.

Com o ambiente preparado de uma escola Montessori, muitas crianças por volta dos 5 anos já são capazes de escrever e ler – e isso foi resultado de atividades espontâneas e prazerosas!

Cada criança tem seu próprio ritmo de desenvolvimento, cada uma é um ser único. Muitas falaram mais tarde, outras andaram mais cedo, mas todas “devem” aprender a ler e escrever obedecendo a uma cronologia rígida…

Quando uma criança anda mais tarde, incentivamos, afirmando: “está quase andando”. Se fala mais tarde, também estimulamos, provocando a fala. Mas quando a criança não escreve nem lê como outras da mesma idade, cobramos e muitas vezes nos esquecemos de estimular, de incentivar e de compartilhar oportunidades de construção que certamente poderão gerar o apoio do qual precisa para vencer aquela etapa natural em seu processo de desenvolvimento.

Para uma criança, ser cobrada daquilo para o qual ainda não está pronta pode ocasionar resultados contrários ao que espera a família, gerando insegurança.

É preciso um olhar cuidadoso no processo de desenvolvimento da criança: é ele que assegura o produto.

Uma criança que atravessa a Educação Infantil demonstrando comportamentos adequados diante das relações que estabelece, da construção do conhecimento, do desenvolvimento psicomotor e da construção de valores certamente não terá dificuldade em apresentar um produto adequado ao final desse processo.

Por volta dos 5 ou 6 anos estará usando a linguagem escrita como forma de comunicação, nível que Montessori aponta como conclusivo dessa etapa do processo.

Ajudar a criança a construir-se é o papel dos adultos, de todos os adultos com quem convive, seja na escola ou em casa. Formar hábitos; nutrir a curiosidade da criança; construir vínculos com o descobrir e o aprender; desenvolver habilidades; ampliar a compreensão do mundo, atribuindo significado a tudo que a cerca e construir o conhecimento são caminhos que a criança necessita percorrer plenamente.

Cada etapa precisa ser acompanhada de forma cuidadosa durante a Educação Infantil. É claro que as crianças são ainda pequenas… Mas precisam ter asseguradas as oportunidades necessárias, com intervenções que cabem aos adultos: zelar para que construam valores socialmente apropriados e que possam desenvolver a autoestima; a segurança; a iniciativa e efetivar vínculos prazerosos com a construção de saberes.

Acreditamos que assim, poderão levar a termo, de forma natural e plena, todas as possibilidades de aprendizagem e efetivar a conquista da leitura e da escrita, assim como andaram e falaram.

Márcia Righetti é educadora, fundadora e diretora pedagógica da Aldeia Montessori.

Como encarar a liberdade e os limites na educação montessoriana

Certamente todos nós já presenciamos (ou protagonizamos) a cena de estarmos em algum local público com uma criança que se esgoela, chora, bate pé e se debate diante de alguma negação ou frustração.

A birra é um comportamento muito comum apresentado por crianças, mas nem sempre compreendido em sua essência pelos pais, os quais, em muitas situações, ao se verem constrangidos, cedem ou apelam para a punição física.

Para uma boa educação montessoriana, é preciso paciência e perseverança. Duas atitudes trabalhosas, principalmente nos dias atuais, em que o tempo parece ser um líquido escorregando entre nossos dedos.

Desde muito cedo as crianças procuram testar os limites daqueles que as rodeiam.
Elas identificam facilmente os adultos que cedem as suas birras e os que não cedem, construindo estratégias diferentes para lidar com cada pessoa em cada ocasião.
É assim que vão estabelecendo suas relações com o mundo.

Se a criança compreender que determinado comportamento a leva a conseguir o que deseja, é natural que volte a repeti-lo.

Se os pais têm dificuldade em adotar uma postura firme, confundindo autoridade com autoritarismo, observa-se como consequência o comportamento inadequado dos filhos, manifestando desrespeito com outras crianças e com os adultos com quem lida. Umas, quando não têm seus desejos satisfeitos, além da birra e do choro, batem e chutam; já outras, em manifestação extrema, cospem no alvo que dificulta conseguir aquilo que querem.

É preciso uma educação em que as crianças aprendam a lidar com o “não”, com a frustração, como a educação montessoriana. Na vida, nem sempre nossas vontades podem ser satisfeitas.

Nas palavras de Maria Montessori, em seu livro Mente Absorvente:

“(…) Deixar a criança fazer porque gosta, quando não desenvolveu ainda nenhum controle, é distorcer a ideia da liberdade.
O resultado que se obtém são crianças desordenadas, porque a ordem que lhes foi imposta estava acima do que poderiam cumprir; preguiçosas, pois foram forçadas a um trabalho para o qual não estavam prontas; e desobedientes, porque sua obediência tinha sido imposta e não construída
.

Na minha prática pedagógica, comprovo que as crianças necessitam de uma educação com limites, mas com regras claras e coerentes. As regras são fundamentais para a construção do caráter, dando segurança à ação da criança.

Então, se a criança fizer uma birra sem motivo aparente e estiver em segurança, “ignore-a”. Mas nesse caso ignorar não significa abandonar, ou não ligar para sua manifestação: significa que o adulto vai ficar perto da criança e sinalizar que só poderão conversar quando ela se acalmar. E o adulto, pacientemente, deve esperar.

Se a birra ocorrer em local público, não ceda à vergonha. Mais importante “do que os outros vão achar” está a formação da educação do seu filho.

Explique claramente o motivo do “não” de forma assertiva, para que a criança compreenda as circunstâncias da negação. Mantenha um tom de voz baixo e tranquilo. Não supervalorize a birra, nem se mostre exaltado. Quando a criança perceber que fazer birras não é a melhor estratégia para conseguir o que quer, vai desistir e deixar de manifestar sua contrariedade pelo choro.

Se a criança tiver um padrão de birras sempre que contrariada, mantenha-se firme. Mais cedo ou mais tarde o comportamento vai se alterar e a paciência compensará.

Para uma boa educação montessoriana, tente também compreender os sentimentos que motivam a birra; ouça, converse e conforte a criança caso se sinta ansiosa ou com vontade de se expressar. Ajude-a a identificar seus sentimentos pessoais e a lidar com as novas emoções.

Importante: não vacile em usar o “não” sempre que a criança tiver um comportamento que possa colocar em risco sua segurança ou a de outros, como o de arremessar objetos ao chão, por exemplo.

Trabalhar regras com as crianças é um exercício demorado, que demanda constância e tenacidade. Muitas vezes teremos de voltar para as mesmas conversas com nossos filhos, assim como acontece quando ensinamos para eles os hábitos de higiene ou as boas práticas na alimentação. Esse é um aprendizado que deve ser construído no dia a dia nas relações familiares e que depois vai se estender nas relações sociais e escolares. É por meio desse exercício que a criança entenderá que a regra serve para estabelecer os direitos e os deveres de cada um, não se reduzindo, apenas, em mera proibição.

Amar os filhos é desejar que se formem como adultos em equilíbrio. Amar os filhos requer dos pais equilíbrio em suas próprias ações.

Por Márcia Righetti, educadora, fundadora e diretora pedagógica da Aldeia Montessori.

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Conhecendo o currículo das classes do Nido, na Aldeia Montessori

A escola de zero a três anos constitui uma das primeiras experiências da criança num sistema organizado, exterior ao seu círculo familiar, onde será integrada e desenvolverá determinadas competências e capacidades.

O entendimento antigo de que o principal objetivo da creche (denominação do segmento de zero a dois anos e 11 meses, de acordo com a legislação brasileira) é a guarda da criança, assegurando sua saúde e alimentação. Nos dias atuais, esse objetivo está sendo complementado por uma ênfase na educação.

O conceito “educare”, que hoje caracteriza o atendimento às crianças de zero a três anos, traduz a ideia de unir as questões de educação (“edu”) aos cuidados maternos (“care”) .

Sabemos que as experiências das crianças em seus primeiros anos de vida estão muito relacionadas à qualidade dos cuidados que recebem; portanto, o ambiente da creche deve se caracterizar como um ambiente acolhedor e preparado para as aprendizagens próprias dessa faixa etária.

Um dos princípios de uma escola Montessori é ter seus ambientes estruturados de acordo com o grupo que recebe; preparando-o de uma forma que nutra a curiosidade da criança e estimule aprendizagens nas diferentes áreas.

No que diz respeito ao ambiente do Nido Montessori (Nido 1 e Nido 2), os critérios de organização são essencialmente os focos nas áreas do desenvolvimento motor e do desenvolvimento da linguagem; e paralelamente, as oportunidades de ação que favoreçam o desenvolvimento emocional.

Nos aspectos do desenvolvimento motor: conquista de movimentos como sentar-se; engatinhar; andar; arremessar; chutar; empurrar; puxar; desenvolvimento da preensão palmar e depois da pequena pega da família, entre outros.

Na vida prática: desenvolvimento dos movimentos para segurar a mamadeira; beber água no copo com ou sem tampa; comer com ajuda, desenvolvendo a mastigação (desde a introdução dos alimentos sólidos até comer a comida comum), ou comer sozinho; colaborar no banho e na troca de roupa, até ser capaz de tirar os sapatos e as meias e depois despir-se e vestir-se, entre outros cuidados pessoais; enfim, são atitudes que a criança vai desenvolvendo para conquistar a independência.

Consideramos como subitens da área da vida prática, com suas características voltadas para os aspectos emocionais, as lições de graça e de cortesia, como cumprimentar; desculpar-se; usar expressões como “dá licença; por favor; obrigada”.

À medida que descobre a si mesma e o espaço do outro, a criança vai exercitando as relações de respeito e de comportamento social apropriado.

No aspecto sensorial: oportunidades para experimentar e explorar diferentes estímulos sensoriais visuais, olfativos, táteis, auditivos e gustativos; a fim de formar conceitos sobre eles a partir de vivências e de experimentações no cotidiano.

Na construção da linguagem articulada: muitas oportunidades para aprender os nomes dos elementos e das pessoas do ambiente, diária e rotineiramente; a fim de que cada uma possa ir gradativamente se apropriando do uso da língua — sem dúvida um grande marco nesse período.

Um ambiente físico ordenado estabelece as bases de uma mente ordenada. Se crianças encontram as coisas no mesmo lugar dia após dia, elas aprendem a reconhecer a que lugar elas pertencem. Em tal ambiente, as crianças crescem confiantes na sua capacidade de ação, pois conhecem e memorizam os recursos do seu espaço; ampliando e aprofundando suas explorações. Tornam-se, então, confiantes de sua própria capacidade intelectual.

Fundamental é, nessa etapa, oferecer vivências da “ordem”, pois é aí que acontece o período sensível para desenvolvê-la no ambiente. Cada material fica disposto em cestinhas e tem seu lugar. A criança observa o movimento do adulto guardando cada coisa em seu lugar, guardando os objetos após usá-los e vai, gradativamente, percebendo a necessidade da ordem.

A criança de zero a seis anos precisa de ordem em sua vida; porém, é a criança de dois anos que se mostra extremamente sensível e receptiva à percepção da ordem e é a ordem externa que vai ajudá-la a construir sua ordem interna e entender a ordem do mundo, construindo sua autoconfiança e competência.

Todos esses fatores serão a linha guia para que nossas crianças também se desenvolvam nos aspectos emocionais.

O ambiente estruturado à maneira Montessori com bases científicas, atendendo ao desenvolvimento da faixa etária que abriga, disponibiliza nos objetos, os quais chamamos de materiais de desenvolvimento, os aspectos do currículo das classes de zero a 17 meses e de 18 a 36 meses.

Falar de currículo é falar de princípios essenciais, valores, finalidades, processos e práticas que formam a base de tudo que sucede em um determinado contexto educativo.

Assim, o currículo para crianças de zero a três anos na escola Montessori abrange uma vasta gama de opções de aprendizagem, experimentação e oportunidades ilimitadas de exploração; pois, nessa etapa de vida, a criança absorve como “uma esponjinha”, por meio dos sentidos, os estímulos do ambiente.

É igualmente importante que tenham oportunidades de “fazerem por elas mesmas” num ambiente seguro e protetor, exercitando a independência, o sentido de ordem, a concentração; desenvolvendo a autoestima, a autoconfiança, a capacidade de fazerem escolhas, de se comunicarem com propriedade e de se movimentarem com destreza cada vez maior.

Ah! E viver a cultura é fundamental para que a criança vá se inserindo no momento que vive, no lugar que vive, ocupando com propriedade cada vez mais crescente o lugar que lhe pertence no mundo.

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Por Roberta Righetti, diretora da Unidade II, da Aldeia Montessori; especialista em Educação Montessori (Centro de Estudos Montessori do Rio de Janeiro), pós-graduada em Educação Infantil (PUC. Rio)

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Referência Bibliográfica:

Montessori, Maria – Mente absorvente,  A Criança, Formação do Homem

 Equipe do Nido Montessori da Aldeia –  Currículo para o Nido Montessori